By Geferson Kern
Esta
é a segunda-feira seguinte a um sábado de corridas para Roger Penske nenhum
botar defeito. Literalmente.
O
fim de semana, pois, foi pra lá de concorrido. Categorias incríveis em circuitos
extraordinários. O Capitão resolveu deixar sua terra natal e preterir a decisão
do título da IMSA, nas já tradicionais dez horas de duração da Petit Le Mans, ou
a sempre especial prova de outono – no hemisfério norte – da Nascar em
Talladega. Foi ao outro lado do planeta ver seus investimentos na (antiga V8)
Supercars, na prova mais prestigiada do campeonato: os 1000 km de Bathurst, no
maravilhoso circuito de Monte Panorama.
Mr.
Penske entrou na competição há pouco. No fim de 2014, comprou 51% das ações da
Dick Johnson Racing, a mais antiga equipe do campeonato, fundada e chefiada pelo
lendário ex-piloto homônimo, pentacampeão da categoria e tricampeão da famosa
prova na montanha. O time, rebatizado como DJR Team Penske, teria Marcus
Ambrose, australiano revelado no Supercars e recém-saído de sua aventura na
Nascar, como principal estrela, mas ele desistiu logo na segunda prova de 2015.
Depois de duas temporadas nem tão chamativas, o time foi buscar seu Josef
Newgarden oceânico. E encontrou seu caminho.
Scott
McLaughlin, curiosamente, é neozelandês como Scott Dixon, maior adversário de
Newgarden e de qualquer um que sente seu traseiro num Penske nos anos 2000, pela
arquirrival equipe Chip Ganassi. Nascido em junho de 93, competia desde 2010 por
competições de suporte ao Supercars ou na versão da categoria de seu país. A
oportunidade no campeonato principal veio em 2013. Após quatro temporadas a
bordo de um Holden ou Volvo pela tradicional equipe Garry Rodgers, foi chamado
para a operação conjunta entre Johnson e Penske, onde pilotaria o lendário #17
usado nas pistas pelo lado australiano da direção do time. Somou-se a isso o
apoio da Ford, que já estava com a Penske na Nascar, bem como da Shell,
patrocinadora de Joey Logano na mesma categoria e que também investe na Indy,
com sua marca principal e a Pennzoil, sempre presente nos carros de Hélio
Castroneves em Indianápolis.
A
receita foi quase certeira já no primeiro ano. Em 26 corridas, entre provas
longas e baterias, fez 16 pole positions e venceu oito vezes. Na última bateria
da prova decisiva, em Newcastle, teve um dia conturbado: sofreu nada menos do
que três penalizações e terminou só em 18º. O título escorria entre os dedos e
ia para Jamie Whincup, maior campeão da categoria, com sete títulos, que compete
pela Triple Eight, o time oficial da Holden – subsidiária da GM na terra dos
cangurus –, com patrocínio da Red Bull e status de equipe a ser batida na
Austrália. Pelo menos era assim até a chegada de McLaughlin à operação da
Penske.
Afinal,
desde aquele fatídico dia, não teve pra ninguém. Em 2018, foram 13 poles e nove
vitórias em 31 rodadas. Estava carimbado o primeiro título, batendo os três
carros da Triple Eight, que vieram na sequência na classificação – o também
neozelandês Shane Van Gisbergen foi o rival direto pela taça, seguido de Whincup
e do veterano tricampeão Craig Lowndes, que se aposentou ao final do ano. Mas
nada que se compare ao massacre que vem sendo a atual temporada, a primeira em
que a Ford substituiu o velho Falcon pelo Mustang.
Quando
escrevo, logo após a visita anual dos Supercars a Bathurst, passaram-se 25
rodadas de 32 previstas. McLaughlin já largou na pole 15 vezes e venceu por
incríveis 18. Seu companheiro Fabian Coulthard – nada a ver com o ex-piloto de
Williams e McLaren na F1 – ganhou outras duas provas, o que dá ao time de
Johnson e Penske 20 vitórias em 25 bandeiradas, incríveis 80% do total. O atual
campeão ficou de fora dos quatro primeiros somente duas vezes – em uma delas,
sequer largou. Lidera com 622 pontos sobre o rival mais próximo, van Gisbergen,
com 1050 tentos em jogo nas sete baterias divididas em três pistas restantes
para o complemento do campeonato – a próxima na icônica Surfer’s Paradise, que
qualquer fã de Indy que se preze conhece muito bem. Apesar de tudo, ainda
faltava algo.
Não
falta mais.
Os
1000 km de Bathurst são as 500 Milhas de Indianápolis do Supercars e do
automobilismo australiano. O lugar por si só é especialíssimo: um circuito de 23
curvas com 6,213 km, que existe cinco vezes por ano, quando as estradas
montanhosas que o formam são fechadas para a prova dos supercarros ou as
maratonas de 6 e 12 horas de duração, voltadas a carros de produção bem espertos
(uma BMW M3 ganhou lá esse ano) e GTs, respectivamente. A corrida, cujo maior
campeão é Peter Brock, com nove conquistas – e por isso o troféu entregue aos
vencedores leva seu nome –, já foi disputada 62 vezes. Dominar a montanha não
era uma novidade para Dick Johnson, com três vitórias lá, mas sim para Roger
Penske. E é claro que o maior campeão da história de Indianápolis entraria de
sola para chegar ao feito.
Na
Austrália, Mr. Penske viu seu mais novo pupilo estabelecer o recorde para a
categoria Supercars do circuito e conquistar a posição de honra no grid de 26
carros. Para a prova, em que os pilotos regulares do campeonato são acompanhados
de convidados, McLaughlin teria a companhia estrelada do francês Alexandre
Prémat, antigo piloto regular da categoria e vencedor do GP de Macau de F3, Le
Mans Series e 24 Horas de Nürburgring. O duo, que havia abandonado na primeira
participação conjunta em 2017 e chegado em terceiro no ano passado, desta vez
completou as 161 voltas antes do que todos os outros.
Não
foi necessariamente fácil nem isento de polêmicas, no entanto. A Triple Eight,
sobretudo, jogou pesado: seus pilotos full time, Whincup e van Gisbergen, foram
acompanhados de Craig Lowndes e Garth Tander, segundo e quarto, respectivamente,
na lista dos maiores vencedores da história do Supercars. Terminaram no Top5,
tal qual o ex-campeão James Courtney, que correu com Jack Perkins e levou ao
pódio a Andretti – sim, o time também está na Austrália, em operação conjunta
com a United – chefiada por Zak Brown, CEO da McLaren – e a Walkinshaw, dirigida
por Ryan, que é filho de Tom – entre outras coisas, conhecido por ser o último
dono da equipe Arrows na F1. Michael Andretti também foi responsável por levar
Alexander Rossi e James Hinchcliffe a Oceania para esta prova, em carro
patrocinado pela mesma NAPA que banca Rossi na Indy e chegou 19º. Quem também
tem relações com a categoria americana é Simona de Silvestro, que corre num dos
quatro Nissan Altima do campeonato. Os japoneses, porém, não levaram grande
sorte no duelo contra Holden e Ford: seu melhor carro chegou em nono, com a
dupla Rick Kelly e Dale Wood.
A
prova em Bathurst já ia para os finalmentes na hora em que surgiu o motivo de
bafafá do fim de semana: McLaughlin liderava quando Coulthard, em segundo,
reduziu o ritmo e permitiu ao parceiro de equipe aumentar a vantagem na
liderança, de modo suficiente a fazer o pit stop que lhe restava e voltar na
ponta. O time alegou que mandou Coulthard reduzir o ritmo para diminuir a
temperatura do motor. A direção de prova, no entanto, aplicou um drive through
no piloto. Os rivais, em especial a Triple Eight, continuam esperneando e há
quem aposte que a vitória de McLaughlin – conquistada por ínfimos 0s68 sobre van
Gisbergen, numa corrida com cerca de 6h30min de duração – possa até ser
revertida. Até segunda ordem, porém, ele é o vencedor, diante dos olhos de
201.975 espectadores (sim, mais de 200 mil australianos, pelo quinto ano
seguido) que estiveram no Monte Panorama ao longo dos quatro dias de
programação. E de Roger Penske, que aos 82 anos, não se cansa de colecionar
vitórias, títulos e eras dominantes em qualquer operação automobilística que
leva seu consagrado sobrenome.
E
ele ainda venceu a IMSA no mesmo dia, mas isso fica para a segunda parte do
texto.
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